Este artigo aborda o tema extremamente atual das neuropatias óticas autoimunes, cujo diagnóstico molecular e classificação sofreu grandes desenvolvimentos recentemente, merecendo particular destaque no último EUNOS (European Neuro-Ophthalmology Society) Meeting.
O título do artigo introduz-nos ao debate acerca do papel dos anticorpos contra a myelin oligodendrocyte glycoprotein (MOG-IgG) nas neuropatias óticas autoimunes. Acompanhamos a argumentação de dois neuroftalmologistas de referência, que procuram defender pontos de vista opostos relativamente à questão: representará a presença de MOG-IgG uma condição clínica independente dentro das neuropatias óticas autoimunes?
Chen defende que sim, e começa por enfatizar a importância desta distinção para o diagnóstico e tratamento adequado da neuropatia ótica MOG-IgG. Realça que a apresentação clínica, a base molecular e o prognóstico da neuropatia ótica MOG-IgG são distintos dos de uma neuropatia ótica associada a esclerose múltipla (EM) ou do espetro da neuromielite ótica (NMO) associada a anticorpos para aquaporina-4 (AQP4-IgG, doença de Devic). Ainda que possa existir alguma sobreposição clínica com a última entidade, a própria fisiopatologia associada aos diferentes anticorpos é diferente, uma vez que AQP4-IgG têm como alvo os astrócitos, enquanto que MOG-IgG estão associados a desmielinização com astrócitos preservados. Para além disso, a neuropatia ótica MOG-IgG tem maior probabilidade de ser bilateral, recorrente e associada a edema exuberante do disco ótico. O seu prognóstico em termos visuais tende a ser melhor que o do espectro da NMO associada a AQP4-IgG. Em termos imagiológicos, a neuropatia ótica MOG-IgG distingue-se pelo envolvimento longitudinalmente extenso do nervo ótico, com realce perineural da sua bainha e das estruturas peri-bulbares. Defendendo a neuropatia ótica MOG-IgG como doença independente, Chen argumenta ainda que vários estudos mostraram que os diferentes anticorpos não coexistem nas neuropatias óticas autoimunes, isto é, doentes com EM não têm MOG-IgG, assim como doentes com AQP4-IgG raramente têm MOG-IgG.
Fraser opõe-se a Chen, defendendo que MOG-IgG poderão ser apenas um marcador de desmielinização presente em várias doenças e não a causa do fenómeno de desmielinização em si. Estudos mais antigos realizados em doentes com EM sugeriam precisamente isso, assim como estudos em modelos animais. Fraser apoia-se também em alguns trabalhos que identificaram pontualmente a coexistência de anticorpos AQP4-IgG e MOG-IgG em doentes com critérios para NMO, propondo que a neuropatia ótica MOG-IgG seja incluída no espetro da NMO, que poderia assim ter três subtipos: 1) AQP4-IgG, 2) MOG-IgG ou 3) positiva para ambos os anticorpos. No entanto, Chen refuta esta ideia e esclarece que a tecnologia utilizada nos estudos antigos mencionados por Fraser está ultrapassada (pouco específica para identificação de MOG-IgG) e a esmagadora maioria dos estudos atuais não identificou efetivamente coexistência de anticorpos.
Ainda que MOG-IgG possa não ser diretamente patogénico, Chen defende que é o marcador de uma doença específica com elementos únicos a nível clínico, fisiopatológico, de tratamento e prognóstico. Precisamente por estes motivos, Fraser acaba por concordar com Chen, afirmando que a doença desmielinizante associada a MOG-IgG deverá ser considerada uma entidade distinta das restantes. Ambos os autores concordam ainda que a sua designação não se deveria limitar apenas a neuropatia ótica MOG-IgG, dado o envolvimento sistémico que geralmente lhe está associado (mielite e encefalite).